Se há antídoto para a perda, outro não é que o amor. É esse o estado capaz de subverter a doença, que surge traiçoeiramente, com tácticas de desagregação da vida, mas, por obra de tal remédio, acaba transformada em reforço de uma certa espiritualidade afectiva, a união plena das almas de quem cuida e de quem é cuidado. Os que se desprendem do resto para poderem dedicar-se ao que realmente importa, os que reinventam – ou redescobrem – a sua capacidade de amar, focando-a integralmente no outro, no objecto do amor, atingem, porventura, o mais raro grau de elevação espiritual. São, ali, almas em almas entrelaçadas. Naquele momento, em que o mais puro de cada um se liga ao mais disponível de cada outro, a realização total do cuidador ultrapassa, em muito, a incapacidade de gratidão a que o cuidado se confina. E será isso que explica os enormes sacrifícios por trás dos relacionamentos assim transformados. Este ensaio fotográfico tenta, tanto quanto pode fazer a fixação das matizes de luz e sombra, captar essa dimensão transcendente. Focar pessoas para registar almas que se cumprem através do amor integral, que aparenta nada ter em troca, mas que em troca recebe tudo. São histórias de vida, claro. Histórias palpáveis. Histórias de casais, de pais e filhos, de sogros e genros... Histórias em que a total necessidade de uns obriga à total entrega de outros, que largam os empregos, largam as vidas que tinham lá fora, largam as vaidades, o materialismo, o egoísmo. Porque, para quem cuida, não há outro sentido a dar à vida, a isso se comprometeu por laços de sangue e de espiritualidade. Mesmo que sem meios, sem tempo, sem dinheiro, sem o amparo necessário nas horas de maior aflição. Cuidam porque amam, amam porque cuidam. De forma diferente, reinventada, adaptada. Portugal é dos poucos países da UE onde o estatudo do cuidador não está aprovado. Há 800 mil cuidadores informais. Mas, provavelmente, mais pura, dessa tal pureza que estas imagens pretendem mostrar: a pureza das almas que, em vida, assumem as formas dos corpos. .